Por Enio Squeff (publicado na “Folha de S. Paulo”, Música/crítica, em 25 de agosto de 1983)
PIERROT LUNAIRE: de Schoenberg. No Instituto Goethe. Pianista: Amílcar Zani; clarinetista: Leonardo Righi; violinista; Maria Vischnia; violoncelista: Zigmund Kubala; flautista: Jean Noel Saaghard; violista: Perez Dvorecki; claronista: Nicola Gregori; cantora: Edmar Ferreti. Regente: Ronaldo Bologna.
Ninguém imaginaria que em qualquer ponto da cidade, a execução do “Pierrot Lunaire”, de Schonberg pudesse superlotar um auditório. Mas foi o que aconteceu com o recém inaugurado teatro do Instituto Goethe, no bairro de Pinheiros. E “Pierrot Lunaire” é realmente um ponto de partida para muitas reflexões.
Assisti ao espetáculo de um ponto insólito: no palco do teatro do Goethe. Não é uma posição muito cômoda; mas não havia outra. Difícil, portanto, qualquer observação mais abalizada. A cantora Edmar Ferretti, como sempre, parece ter se saído muito bem: é uma intérprete adequada para a música contemporânea. Essa aliás, parece ser a questão. É a segunda vez que ouço o maestro Ronaldo Bologna na regência de “Pierrot Lunaire”; não foi a única em que vi atuando como maestro. Não acho, porém, que me equivoco se o considerar especialmente talentoso para a música contemporânea.
Ora, este é um problema especialíssimo. Existem cantores que no afã de se tornarem conhecidos fazem textualmente o diabo: de música popular de qualidade duvidosa a papéis que suas vozes não aguentam. Não preciso citar exemplos. Os que acompanham a vida musical de São Paulo sabem a quem me refiro, mas não é uma síndrome só dos cantores. Existem regentes jovens que gastam boa parte de seu tempo a prepararem obras difíceis, quando sequer conseguem fazer um Mozart minimamente decente. Em todos os casos, concorrem, ou melhor, pensam em concorrer respectivamente com Christa Ludwig e Otto Kemplerer, quando apenas se expõem ao ridículo.
Não é de modo algum o caso do maestro Bologna ou da cantora Edmar Ferreti, para citar apenas dois dos competentes músicos que interpretaram “Pierrot Lunaire” no Instituto Goethe. Mas não o é, na medida em que exercem sua função com seriedade e humildade. Precisaria acrescentar, porém, que fariam muito melhor se se dedicassem com afinco à difusão da música contemporânea, principalmente da primeira metade do século? Acho que não; pois, de resto, público existe. Desconfio que o bairro de Pinheiros seja um pouco, à sua maneira, este tipo de proposta do Instituto Goethe. Mas essa claro, é outra história.