Flauta Mágica, um bom espetáculo

Por Enio Squeff (publicado na “Folha de S. Paulo” – Ópera/Crítica, em 24 de setembro de 1983)

Teatro Municipal “Flauta Mágica” Elenco: Carlos Belbey (Tamino), Efigenia Cortez (Pamina), Caio Ferraz (Papageno) e Tereza Godoy (rainha da noite); Orquestra Jovem, com regência de Jamil Maluf, direção de cena de Cláudio Lucchesi e direção artística de Luiz Malheiro.

Encontrei alguns maçons conhecidos na versão da “Flauta Mágica”, de Mozart, que o pessoal do Teatro Lírico de Equipe e a Sinfonica Jovem Municipal estão apresentando no Municipal. Devem ter ido ao espetáculo como quem também vai a uma cerimônia. Não sei se é o caso: nesta interessante montagem (ou em outra qualquer) o personagem Papageno (o mais humanizado ditador) é o único a desistir dos sacrifícios de “iniciação”. Difícil saber onde localizar o confessionalismo desta obra.
É um aspecto; mas os outros só recomendam este espetáculo que será repetido hoje às 21horas. Músicos e cantores não são profissionais; a montagem, pela singeleza, talvez dispensasse qualquer observação. Certa vez, o Flávio Rangel, me disse que gostaria de dirigir “A Flauta Mágica”: como grande diretor que é, não sei se não buscaria exatamente alguns efeitos que o diretor Cláudio Luccesi e sua equipe cenógrafos e figurinistas apresentam. Ou seja, não sei se o profissionalismo não desembocaria na maior parte das soluções que, estes amadores conscientes, foram buscar e na qual se sente algumas sugestões de versão filmada por Ingmar Bergman.
Há, porém, a música e este é a maior surpresa desta montagem. Alguns cantores como Tereza Godoy (Rainha da Noite), Carlos Belbey (tamino), Efigenia Cortez (Pamina) merecem quase todos os elogios. Outros como, Pedro Coca, Roberto Expedito Casemiro (os guardas) ou Cristina Cordeiro, Teca Arantes, Yuka Yamamoto (gênios) além de Annie Lacour (Papagena), Eduardo Janho Abumrad (Sarastro) e Celso Antunes (Monostatos) demonstram qualidades inequívocas. Inútil desconsiderar o esforço de amadores – mais inútil não ver nisso também, o excelente trabalho do maestro Jamil Maluf e seus diretores de coro. Verdade que, algumas deficiências ficam patentes: o barítono Caio Ferraz (Papageno), por exemplo, é um bom ator; mas nem sempre responde com potência de voz o que sua boa presença no palco poderia sugerir. O mesmo talvez valha para Thelma Badaró, Elisa Nemeth e Vania Soares (damas). Seja como for, esta “Flauta Mágica” não deixa muito a desejar. Esta quem sabe é a questão: de profissionais se exige que não sejam amadores, mas de amadores não se exige que sejam profissionais. Ora, esta “Flauta Mágica” que o Municipal apresenta, se comparado com alguns espetáculos que já vi no Teatro, escancara as diferenças do amadorismo principalmente no que isso supões de dedicação e amor à arte. Não é pouco se essa exigência que es faz dos profissionais (e que nem sempre se encontra) e se isso apenas destaca algumas deficiências que nossas orquestras profissionais apresentam. Mas creio que, é este o papel histórico dos amadores; e é uma experiência que eu, sinceramente, gostaria de ver repetida, pois não desmerece a grande música, mesmo de um Mozart.